Porsche
— Ei! Não me diga que você vai me deixar no mesmo lugar de ontem! — Uma voz rouca perguntou perto do meu ouvido.
Pelo que aparentava ontem, hoje ele parece bem melhor, mesmo que tivessem novos machucados junto aos antigos, seu rosto ainda parecia muito bonito.
— Por que você voltou? — perguntei calmamente, olhei para trás pelo espelho da moto, um homem de preto nos seguia me fazendo acelerar.
Estou mais preparado que ontem, estava dirigindo sem problemas pelos becos, conduzindo sem muito esforço minha moto.
— Ei, vá devagar! — A voz rouca disse alto, enquanto apertava minha cintura, com seu rosto escondido nas minhas costas. Talvez estivesse tentando se proteger do vento batendo em seu rosto.
— Segure firme. — murmurei antes de acelerar, abandonado o homem de preto atrás da gente.
— Shia, ainda estou vivo! — Kinn disse em um tom divertido enquanto olhava ao redor.
Depois de ter certeza que ninguém mais nos seguia, parei a moto. Bem, eles não conseguiram nos seguir, eu sou muito bom pilotando, o caminho que escolhi é bem complicado, os enganando para nos seguirem, acelerando e virando até que ficasse tão longe que não pudessem mais nos acompanhar.
Soltei um suspiro de alívio quando parei a moto na frente da minha casa.
— Onde diabos…
— Minha casa. — Não quero colocar minha vida em risco, mas no meio da fuga o caminho que fiz foi o que eu conhecia, e antes que me desse conta já estávamos aqui. — Vamos entrar e lavar o seu rosto. — Ele soltou o ar pela boca em alívio como se tivesse saído de uma tour no inferno.
— Espere. — Eu o alcancei e passei primeiro pela porta, peguei um maço de cigarro na minha calça e o acendi, ele não disse nada mas levantou uma sobrancelha para mim.
— Cinquenta mil. — falo com o cigarro na boca e olho para ele.
— Huh? — Ele deu uma risada curta, então me olhou em descrença.
— Ontem, meu relógio…
Antes que ele terminasse de falar eu engoli seco e interrompi suas palavras. — Ontem foi ontem.
Secretamente estou com um pouco de medo de que ele vá querer o relógio de volta, então fingi ser cara de pau, assim ele pensaria duas vezes antes de o querer de volta.
Porque mesmo se quisesse, o relógio não estava mais comigo, o dinheiro do relógio eu usei para pagar a escola do Che, o ar condicionado quebrado do quarto e também algumas dívidas, não tinha sobrado quase nada.
— Ontem você pediu cinquenta mil, hoje por mais cinquenta num total de cem mil, eu sei que você tem uma breve ideia do quanto aquele relógio valia. Se você não for muito estúpido pode vender por pelo menos uns 400 mil, então se você parar para pensar eu já te paguei adiantado. — Ele disse com um sorriso no canto dos lábios, inclinando a cabeça como se me provocasse.
Foi a primeira vez que parei para olhar mais a fundo seu rosto, os olhos afiados com um brilho perigoso olhando diretamente para mim como se dissesse que ele não é uma pessoa comum.
Mesmo que seu rosto tivesse uma marca roxa do lado direito perto do olho, não escondia o fato de que ele era um mestiço bonito com sotaque europeu.
Ele parecia com um nobre de uma família super rica.
— Okay, agora que te salvei, você pode voltar para o lugar de onde veio.
— Eu não esperava muito mas, tsk, eu nunca pensei que você fosse um ladrãozinho, considerando seu rosto bonito. Com quem eu estou me metendo? — Ele disse rindo, seus braços cruzaram em frente ao seu peito em uma pose convencida.
Seus olhos, boca e bochechas se esticaram em um grande sorriso, fazendo meu pé coçar.
Quero chutar seu estômago.
— Você pode só calar a boca e ir embora?
— Que porra de barulho é esse? — O som da porta abrindo foi seguido por meu irmão vestindo pijama. Ele estava um pouco atordoado quando viu que eu não estava sozinho, fazendo uma saudação, envergonhado. — Oi. — Che disse com um pouco de vergonha.
O bastardo olhou para meu irmão e acenou levemente.
— Volte para dentro. — Eu disse para Che.
— Que caralhos vocês estão fazendo aí fora? Vocês vão acordar os vizinhos, venham conversar aqui dentro. — Che, que sempre foi tímido, estava me respondendo agora.
— Bom, você se importaria? — A figura alta disse se dirigindo para entrar, mas eu fui rápido em o puxar pela parte de trás do colarinho.
— Eu vou entrar e você, vaza! — Eu disse friamente para ele, o que fez com que seu rosto, que mais parecia o de um idol, franzir a testa incrédulo.
— Como você se atreve a fazer isso comigo? — Ele falou em um tom perigoso.
Mas eu não estava com medo, virei as costas pronto para entrar em casa.
— Ei, espere! Ninguém se atreve a fazer isso comigo. — Ele disse, apertando suas garras no meu pulso.
Me soltei de seu aperto e empurrei forte seu peitoral. — Por que? Quem é você? Eu posso fazer muito mais do que só te puxar pelo colarinho! — o encarei com a mesma intensidade que ele olhava para mim — Se você não for embora agora, eu vou te comer na porrada!
— Ei! Ei! — Che que saiu de casa novamente, me segurou pelos ombros.
— Vá pra dentro. — Eu disse para o meu irmão o empurrando para dentro e o segui, batendo a porta na cara do Kinn.
Huh! Eu não tenho medo dele, esse bastardo, quem diabos ele pensa que é? E daí que ele é rico? E daí que eu lhe devo um relógio?
•••
Liguei para Jae Yok pensando que ela poderia estar no hospital, mas ela não estava, ela disse tudo o que aconteceu depois que saímos, que os gângsteres se dispersaram assim que fugimos, e que a polícia foi envolvida também, ela reclamou até minhas orelhas doerem.
Eu tenho que limpar o clube, salvar o que eu conseguir e rezar para que o prejuízo não me custe muito.
— Para onde vocês dois correram? — Jae perguntou na manhã seguinte.
Eu não a respondi, para evitar um mal entendido.
Eu tinha levado um cara para casa e isso era algo.
— Eu sinto muito, Jae. — curvei minha cabeça para mostrar o quanto eu sentia pelos danos no clube, Jae suspirou.
Eu sei que tenho culpa, mas isso não é algo que eu faria, é tudo por causa do Kinn, eu apenas fui arrastado para essa confusão. Se eu soubesse o que iria acontecer não teria me metido em seus assuntos.
— Tudo bem, vamos empacotar as coisas, os móveis novos vão chegar em breve. — Jae disse, dando tapinhas em meu ombro.
— Q…Quanto? — perguntei em uma voz suave, mesmo que não estivesse pronto para ouvir um valor alto.
— O quê?
— O custo dos móveis danificados.
— Huh, por que? Você tem o dinheiro para me pagar? — Jae perguntou, abanando seu rosto com o leque.
— Eu tenho um pouco guardado. — Eu falei, porque, mesmo que eu não seja o causador da briga, ainda assim me sinto culpado.
— Heh, você é sortudo, senhor Kinn veio aqui e pagou por todo o prejuízo ou então você iria trabalhar por toda a vida e ainda estaria afogado em dívidas.
— Kinn? — Um rosto bonito com um sorriso arrogante apareceu rapidamente em minha mente.
— Sim, senhor Kinn disse que aqueles eram inimigos dele e que você estava apenas lá para ajudá-lo, então ele te ajudou pagando agora, e sabe do que mais? Quando a polícia chegou os bandidos fugiram. — Jae disse rindo. — Eu acho que esse senhor Kinn é alguém importante, hoje de manhã os vizinhos estavam todos quietos. O tumulto da noite passada não se espalhou e quando fui ver as câmeras de segurança tive arrepios por todo meu corpo.
— Por quê? — perguntei.
— Bem, ele é tão lindo, mas tão lindo que dá medo. Com quem você acabou se metendo dessa vez? A palavra "marido" estava escrita em sua testa.
Eu literalmente me engasguei com as palavras da Jae, balancei minha cabeça e fui ajudar os outros a limpar as manchas de sangue pelo estabelecimento.
Na noite passada ninguém se feriu muito, alguns têm machucados, uns cortes no tronco, alguns têm olhos roxos, mas nada mais que isso.
Os outros brincaram que tinham segurado a barra para mim, não pude deixar de me sentir grato, então eu disse que iria os chamar para jantar como um pedido de desculpas.
•••
Andei até a área de fumantes perto da saída de incêndio do clube, já era nove da noite e tudo estava no lugar.
Hoje, o estabelecimento estava fechado, mas todos os funcionários ajudaram na limpeza, deixando tudo organizado. Eles foram embora todos juntos e agora, eu sou o único que sobrou para trancar o clube.
Descansei sentado em um balde virado perto da porta, soltando a fumaça do cigarro no ar. De repente, escutei alguém se aproximando, eu quase posso saber quem é apenas pelo som de seus passos.
— Oi. — O recém chegado parou a alguns passos de mim, todo vestido de preto.
— O que você quer agora? — perguntei irritado, jogando o cigarro no chão pisando nele, minhas mãos estavam em minha cintura.
Kinn andou em minha direção devagar, olhando ao redor como se estivesse sendo cuidadoso no caso de alguém aparecer. Notei que ele estava vestido pronto para uma luta.
— O que é isso? Você quer morrer? — Eu disse ficando um pouco exaltado, e se alguém vir e destruir tudo de novo? Jae definitivamente iria me matar.
Ele parou na minha frente sem dizer nada. — Tenho uma proposta para lhe fazer. — Ele disse calmo, depois de um tempo, mas meu coração bateu rápido como se eu estivesse com medo do que iria acontecer.
— O que é? — Eu disse friamente sem deixar que minhas emoções aparecessem.
— Venha comigo.
— Para onde nós vamos?
— Temos que ter uma longa conversa. — Ele disse, enquanto olhava diretamente para mim, suas mãos estavam dentro dos bolsos.
— Não quero. — Eu disse, com a intenção de voltar para dentro do clube, meu coração estava acelerado.
Então ele agarrou meu braço e segurou com força. — Mas eu tenho algo para te dizer.
— Mas eu não, me solta! — Com um giro rápido me soltei do seu aperto e o empurrei para longe de mim.
Me segurei em uma mesa quebrada que estava do lado de fora para ser jogada e a lancei diretamente nele e soquei seus subordinados que se aproximaram.
Quando Kinn não aguentou mais ver seus homens caindo um por um, ele veio entre mim e outra pessoa, eu pretendia socar a cara dele, mas meu pulso ficou no meio do ar quando eu ia fazer isso.
Eu estava tão agitado que fiquei distraído, alguém conseguiu me pegar pelos braços, torcendo meus pulsos e me prendendo contra a parede, não entendo como ontem ele parecia tão fraco, mas agora é um homem diferente.
Ele é mais forte do que eu pensava!
— Me solta! — Eu disse com raiva.
Ele segurava a parte de trás da minha cabeça, puxando meu cabelo com seus dedos, o rosto dele se aproximou do meu como se fosse me beijar.
Meu Deus!
— Não, eu estou aqui para negociar com você. — Seus lábios sussurraram perto do meu ouvido, eu podia sentir sua respiração batendo no meu rosto.
O que?!
— Eu não quero conversar! — falei tentando afastar meu rosto, estava sentindo arrepios por todo meu corpo.
— Heh, achei que você seria melhor que isso, mas você está dificultando as coisas, huh?
— Sim! — Dito isto, pulei em cima dele agarrando seu pescoço e enterrando meus dentes em sua garganta. O idiota estava chocado e com dor, ele me empurrou para longe me fazendo ficar livre do seu aperto.
Corri até o clube trancando a porta e chegando rápido até o depósito pegando meus pertences.
Merda! Ele veio pegar o relógio!
Depois de escapar da morte, peguei minha moto rapidamente e fui para casa na velocidade da luz.
Minha cabeça estava cheia de pensamentos sobre o relógio, se Kinn veio e disse que queria conversar comigo, o que mais ele iria querer depois?
É óbvio que era o relógio!
Quem não iria? Aquele relógio valia mais de 600… Não, 700 mil!
•••
Às seis da manhã acordei cedo para ir ao mercado comprar os ingredientes para o café da manhã, não tive que acordar o Che porque não consegui dormir.
Kinn, aquele cuzão!
— Ohoi, você deve ter uma amante rica, hein? — Che disse, olhando para a comida na mesa.
— Comprei mais para empacotar para o almoço, se apresse ou vai chegar tarde na escola.
O café da manhã de hoje parecia melhor que os outros, com pães, geléia, leite e suco de laranja, quando normalmente temos arroz com ovo ou arroz com carne de porco cozida.
— Por favor, me dê uma mesada também. — Che pediu fazendo carinha de cachorro que caiu da mudança.
Procurei por meu bolso e dei uma nota de mil para ele.
— Shia! — Seus olhos ficaram arregalados olhando confuso para mim.
— Essa vai ser sua mesada para o mês inteiro. Não fique muito arrogante. — Eu disse para ele, pensando ser melhor dividir o dinheiro antes que os homens do Kinn viessem pegar.
— Você está bem rico esses dias, hum? Onde você conseguiu?
— São minhas economias.
Meu irmão não acreditava em mim, me olhando como um idiota.
— Vá para escola estudar, e economize!
Olhando para ele em seu uniforme azul, suspirei aliviado, pelos menos com o dinheiro que tenho agora deve ser o suficiente para cobrir todo o semestre.
Todo mundo deve se perguntar o motivo de eu ter mandado meu irmão para uma escola cara quando nós dois estamos quebrados pra caralho.
É porque não quero que ele sinta que estamos em falta.
Ele vem estudando naquela escola desde o jardim de infância, não quero transferi-lo até que tenha se graduado. Não quero que ele se sinta inferior a mim, mesmo que ele diga às vezes que não se importaria em estudar em uma escola barata, eu não quero isso, quero que ele se sinta protegido como antes, quando nossos pais estavam vivos.
Não importa o quão difícil seja, eu vou cuidar do meu irmão.
Tranquei a porta e sentei na minha moto quando pensei em algo.
Kinn sabe onde fica minha casa! E se ele vir me assombrar aqui?
— Tia Aoi! — gritei para a vizinha gentil. — Se alguém vir aqui perguntar por mim, diga que me mudei para longe.
— Quem vai vir te procurar? — Tia Aoi olhou para mim curiosa.
— Apenas diga que eu saí do país.
Tia Aoi concordou e eu voltei tirando tudo da frente da casa, sapatos, chinelos, sombrinhas, capacetes coloridos e os pneus deixando a entrada vazia. Por sorte, eu não tive dinheiro para comprar móveis, então não tinha muita coisa lá dentro.
•••
— Porra, Porsche! Você tem que ter mais cuidado! — Jom disse enquanto íamos para a cafeteria, quando a aula acabou.
— Por quê?
— Você tem que olhar para os dois lados sempre, e se aqueles bandidos voltarem?
— Oh, você parece paranóico, e não se preocupe, não vou ajudar você de novo, na última vez duas pessoas quase morreram lá na Jae. — Tem olhou para mim bruscamente, os dois fugiram assim que a situação ficou ruim para o nosso lado.
— Quem não correria? Porra! Eles estavam em todos os lugares! Um deles me pegou e eu quase engasguei de medo. — Jom reclamou alto.
— Ei, Jom, tem alguém procurando por você. — disse Aom, o primo do Jom.
— O que? E quem é?
— Eu não sei, só vai para o portão da frente, ele está te esperando lá.
— Como ele se parece?
— Ele é bonito e meus colegas de classe disseram que ele é famoso também. Ele está vestido com o uniforme com a logo de administração, é melhor não deixar ele esperando.
Eu lembro que falei para o cuzão do Kinn que meu nome é Jom.
Meu pai do céu, ele está aqui para me pegar?
— Oh, você está indo? Vá em frente, eu vou ficar bem. — Eu falei nervoso, não estou com medo de apanhar, mas estou apreensivo com o fato de ele ter vindo aqui para pegar o relógio de volta.
— Ei, o que tem de errado com você, Porsche? — Tem perguntou, notando o suor na minha testa.
— Nada, vocês dois vão agora! Vão! — Eu disse um pouco mais alto, para que eles fossem embora e me deixassem sozinho, enquanto rezo para que fiquem bem.
Kinn não machucaria meus amigos, certo?
— Merda! Aquele Phi Aom estava tirando uma com a nossa cara! — Jom exclamou, voltando para nossa mesa.
— O que? Por quê? — Perguntei curioso.
— Nós ficamos esperando do lado de fora do portão por uns dois minutos, mas ninguém apareceu! Tenho certeza que foi uma pegadinha do Aom, eu vou matar ele! — Tem disse com raiva.
Os dois acendem um cigarro e foram para o shopping mais próximo, enquanto eu voltei para casa nervoso.
Assim que cheguei, imediatamente perguntei à tia Aoi. — Tia, alguém veio procurar por mim?
— Ohoi, sim! Mas quem eram eles? Pareciam ser capangas da máfia, você está bem, Porsche? Ele perguntou por alguém chamado Jom, eu disse que não tinha ninguém chamado Jom morando aqui e que sua casa estava abandonada há um bom tempo, então eles foram embora imediatamente.
— Quando eles vieram, tia?
— Pela tarde.
Ah, isso é bom, eles vieram quando eu não estava em casa.
— Tia, eu posso estacionar minha moto na sua casa?
— Oh, ok. Pode sim, Porsche, se cuide, ok?
— Sim, tia. Obrigado.
E se Kinn mudasse de ideia me dando cinquenta mil ao invés disso e pegasse o relógio de volta? É uma pena, 700 mil contra 50? Eu seria tão estúpido?